Davis Cup Finals. O torneio que quer revolucionar o ténis chega com muito cepticismo

Jose Manuel Alvarez / Kosmos Tennis

MADRID — Nos painéis publicitários espalhados por toda a cidade, nos ecrãs gigantes da famosa Gran Vía e até nas estações de metro. De 18 a 24 de novembro, Madrid recebe a primeira edição das Davis Cup Finals, que reúnem 18 seleções na Caja Mágica em busca do título no “novo” Campeonato do Mundo do Ténis. Mas o formato de Gerard Piqué, David Haggerty e companhia está longe de agradar a todos e isso no elenco e na bilheteira.

Com dois wild cards à disposição, a competição sofreu uma baixa de peso quando Roger Federer a recusou a ir a jogo. A informação nunca foi confirmada, mas a organização estaria à espera de um “sim” do ex-número 1 do mundo para atribuir à Suíça um dos dois wild cards — acabaram por ser entregues à Grã-Bretanha (numa altura em que ainda não se sabia o que aconteceria a Andy Murray) e à Argentina, que está em Madrid mas sem a figura que mais chamaria pelo público — o lesionado Juan Martin del Potro.

Rafael NadalNovak Djokovic mostraram-se mais recetivos — mas estão longe de serem totalmente a favor. O espanhol foi rápido a reconhecer que jogar duas competições por equipas — a época fecha com as Davis Cup Finals, no final de novembro, e começa com a ATP Cup, no início de janeiro — “não é o ideal e na minha opinião temos de criar uma competição realmente grande para continuarmos juntos” mas não hesitou em jogar e espera que funcione; quanto ao sérvio, uma das maiores vozes dos últimos anos a favor de mudanças sérias na Taça Davis, teceu críticas à forma como o formato foi decidido e revelou que este não é o que mais lhe agrada.

Dos chamados “Big Four”, Andy Murray foi o que mais entusiasmo demonstrou em relação às Davis Cup Finals. Na antevisão ao torneio, o britânico — que foi dos primeiros a chegar a Madrid — deixou também um aviso aos mais céticos.

“Estou entusiasmado e intrigado para ver como é que este formato vai ser”, revelou à imprensa na terça-feira. “Vou sentir falta do ambiente porque acho que não vai ser o mesmo que vivemos nas eliminatórias que joguei ou em casa ou fora. Eram ambientes difíceis mas dos quais eu me lembro, como quando ganhámos a Taça Davis na Bélgica ou jogámos em Israel. Vou sentir falta disso mas espero que aqui também seja muito bom”.

“Há algumas pessoas que parecem desejar que não corra bem mas eu espero que seja um verdadeiro sucesso. Os jogadores e os fãs têm de dar uma oportunidade e ver como corre. Quando o torneio terminar vamos ter uma ideia mais definida do que correu bem ou mal”, completou o ex-número 1 mundial, peça fundamental na histórica conquista da Grã-Bretanha em 2015.

Entre ceticismo, desgosto total e fadiga depois de mais um ano longo, a verdade é que apenas 5 dos 10 melhores jogadores do mundo (e um total de 11 entre os 20 primeiros) vão estar em Madrid quando o principal objetivo da reforça da Taça Davis era atrair e juntar mais jogadores de topo.

Os números não mentem mas é preciso ir mais longe para os perceber: a Áustria de Dominic Thiem perdeu nas Davis Cup Qualifiers (sem o seu número 1) e a Grécia de Stefanos Tsitsipas (que só em setembro deste ano se estreou na competição) jogou e venceu no Grupo III.

Quer isto dizer que dos cinco top 10 que não estarão em Madrid só três poderiam fazer a viagem se o desejassem. Quem são eles? Roger Federer, com o já relatado caso, Daniil Medvedev e Alexander Zverev.

O russo fazia parte da convocatória da Rússia e alimentava as esperanças de uma das seleções mais fortes da semana, mas desistiu depois de participar pela primeira vez no Nitto ATP Finals. Relatos vindos do país dizem que ficou devastado por ter de abdicar da participação devido à fatiga extrema (disputou 80 encontros este ano, dos quais venceu 59).

E o alemão foi uma das vozes mais críticas da mudança. Presença habitual na seleção ao longo dos últimos quatro anos (uma das raras eliminatórias que falhou foi a que mesmo assim a Alemanha venceu em Portugal), o atual número 7 do mundo considera que “a Taça Davis é muito mais do que o dinheiro que nos estão a oferecer agora. É a história do nosso desporto, é um evento histórico e centenário e não faz sentido sem as eliminatórias tradicionais em casa e fora”.

Não só histórica como única no panorama desportivo, a Taça Davis vinha a perder ênfase de uma forma significativa nos últimos anos em termos da cobertura mediática que recebia — agora, a sala de imprensa tem o dobro do tamanho em relação à que é usada durante o Mutua Madrid Open (um Masters 1000 e Premier Mandatory WTA combinado) e as mesas estão todas reservadas… — mas os esforços recentes de jogadores como Roger Federer (que ajudou a Suíça a vencer o torneio pela primeira vez em 2014) e Andy Murray demonstraram que, com mais ou menos interesse e divulgação, continuava a importar aos principais protagonistas.

Se conseguirá renascer sob a égide de Gerard Piqué (o futebolista do Barcelona que através da sua empresa, Kosmos, vai investir 3 biliões de euros ao longo de 25 anos e desempenhou um papel fundamental nas transformações) e David Haggerty (recentemente reeleito, em Lisboa, como Presidente da Federação Internacional de Ténis) só o desenrolar do tempo o dirá.

Gerard Piqué, David Haggerty e Rafael Nadal
Gerard Piqué (à esquerda), David Haggerty (no meio) e Rafael Nadal (de costas) | Kosmos Tennis

Certo é que a primeira edição ficará longe de ser um fenómeno de bilheteira.

Cada jornada está dividida por sessões em cada um dos três courts — de manhã (11h) joga-se uma eliminatória, à tarde (18h) outra e é dessa forma que os adeptos que se desloquem à Caja Mágica têm de adquirir os ingressos.

Olhando apenas para a jornada inaugural, o bilhete mais barato para entrar no Centre Court (capacidade para 12.500 espetadores) custa 25 euros. No Stadium 2, mais pequeno (3.500 espetadores) e intimista, os bilhetes têm preço único: 45 euros em qualquer dos setores. E no Stadium 3 (2.500 espetadores) a tabela de preços repete-se.

A eliminatória inaugural revelou-se um sucesso na bilheteira: às 13 horas de Madrid desta segunda-feira (a 1h30 do início da sessão especial) já só faltavam vencer 812 bilhetes para uma tarde que também contou com a cerimónia de abertura. Ou seja, foram vendidos 93,51% dos bilhetes.

A presença de jogadores como Marin Cilic e Daniil Medvedev — que faziam antever uma eliminatória de “fogo” que poderia ter grandes influências na luta final — terá certamente tido influência na afluência, mas quer um quer outro jogadores retiraram os nomes da competição nos últimos dias…

A cerimónia, essa, deixou bem evidente o contraste entre a aposta da organização no torneio e a vontade do público: o espetáculo de vídeo mapping, música e dança impressionou pela bonita forma como misturou várias artes (do ponto de vista artístico, o resultado seria capaz de rivalizar com qualquer outro por esse mundo fora) mas não fez encher nem metade do palco principal da Caja Mágica.

Também às 13 horas, mas para o Stadium 2 (onde se joga a eliminatória entre Itália e Canadá), tinham sido vendidos 69,69% dos bilhetes. Para o Stadium 3, onde se joga o Bélgica vs. Colômbia, 64,12%.

Nem eliminatórias como o França-Japão, o EUA-Canadá ou o Sérvia-Japão (que marcará a estreia de Novak Djokovic) estão, para já, próximas de esgotar os respetivos estádios.

Das seleções visitantes, apenas a Grã-Bretanha — tradicionalmente apoiada por muitos espetadores em qualquer que seja o palco em que vai a jogo — tem a certeza de jogar perante casa cheia: dos 2.500 bilhetes disponíveis para a eliminatória de estreia, frente à Holanda no Stadium 3, às 13 horas de Madrid desta segunda-feira já tinham sido vendidos 2.357 (= 94,28%).

De resto, e como seria de esperar, a Espanha já sabe que vai jogar as suas três eliminatórias da fase de grupos perante casa cheia.

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