De rebelde a lenda com festa portuguesa pelo meio: os 100 títulos de Federer

Na Europa, na América, na Ásia e na Oceânia. Em piso rápido, relva, terra batida tradicional e até azul. Por baixo de um teto ou ao ar livre. Roger Federer celebrou este sábado a conquista do 100.º título de singulares no circuito ATP e entre tantas histórias e festas há até uma em solo português.

É preciso recuar ao dia 4 de fevereiro de 2001 para encontrar o primeiro título de Roger Federer no circuito ATP. Por essa altura, o suíço já tinha sido número 1 mundial de juniores e era apontado como um dos nomes a seguir atentamente no futuro mas o mundo do ténis estava longe de conseguir imaginar que dali sairia uma das maiores estrelas que este desporto já viu — senão mesmo a maior.

Mas nem sempre foi tudo um mar de rosas. Antes de se tornar na superestrela que nos dias de hoje é conhecida um pouco por todo o planeta, Roger Federer era um rapaz rebelde com um temperamento difícil, que partia raquetes e tinha atitudes menos felizes dentro do court.

Quis o destino que a chegada aos 100 títulos acontecesse no Dubai, a cidade que entretanto se tornou na sua residência oficial e um dos torneios em que é mais bem sucedido mas, também, onde Roger Federer viveu um dos episódios mais difíceis da sua carreira: na sua primeira aparição no torneio, em 2002, o suíço superou a primeira ronda (6-3 e 6-4 vs. Adrian Voinea) mas não encantou na segunda (perdeu por 6-3 e 6-1 para Rainer Schuettler), um resultado — e sobretudo uma prestação — que levaram o diretor do torneio à data, Jeff Chapman, a criticá-lo publicamente e a decidir-se pela congelação do prize money destinado ao suíço, bem como o seu bónus pela comparência.

A organização enviou mesmo uma gravação vídeo à ATP, que acabou por decidir a favor do suíço: não se tratou de tanking, ou falta de esforço, mas simplesmente de uma má prestação (a reação de Roger Federer não se fez tardar e não só não cedeu qualquer set rumo ao título no ano seguinte como o conquistou por cinco anos consecutivos).

Entre uma desilusão em Hamburgo 2001 frente a Franco Squillari (num encontro em que destruiu raquetes e não conseguiu lutar como queria) e a o choque da morte de Peter Carter (o seu primeiro treinador), Roger Federer percebeu que precisava de mudar. O “menino rebelde” e irreverente que protestava constantemente em court tinha de crescer, concentrar-se e focar-se no trabalho. E assim o fez.

Agora, dezoito anos passados, são precisos três dígitos para se contarem os títulos conquistados pelo jogador natural de Basileia no circuito ATP. Uma história que parece não ter fim e que entre tantos momentos tem alguns inesquecíveis. Recordá-los pode até tornar-se exaustivo (afinal, 100 é um número grande) e porque a memória nem sempre faz jus à história aqui ficam alguns dos momentos mais marcantes:

  • Wimbledon 2003

Um mês depois de perder na primeira ronda (!) de Roland Garros, Roger Federer deu início àquela que ficaria para a história como a quinzena do seu primeiro título em torneios do Grand Slam. O adversário na final foi Mark Philippoussis e os parciais da vitória 7-6(5), 6-2 e 7-6(3).

  • Australian Open 2004: O número um

O primeiro título do Grand Slam em piso rápido foi conquistado em Melbourne, onde com uma vitória frente a Marat Safin conseguiu fazer o dois em um: sagrar-se campeão do Australian Open pela primeira vez e subir ao primeiro lugar do ranking mundial.

Mal ele sabia, mas começava aí mais um recorde: entre 2 de fevereiro de 2004 e 17 de agosto de 2008 esteve 237 semanas consecutivas no primeiro lugar do ranking (o segundo melhor registo é de Jimmy Connors, com 160).

  • Wimbledon 2007: cinco títulos consecutivos

Nos anos anteriores Roger Federer já se tinha afirmado como o “rei da relva” mas foi em 2007 que atingiu o seu registo mais impressionante no All England Club: cinco títulos consecutivos, um número que só não aumentou porque no ano seguinte foi derrotado pelo arquirrival Rafael Nadal numa final épica que ainda hoje é considerado um dos melhores encontros da história.

https://www.youtube.com/watch?v=7ciKBckc4ug

  • Cincinnati 2007: A chegada aos 50 títulos

Roger Federer só precisou de seis anos e meio para chegar aos 50 títulos de singulares no circuito ATP, com o Masters 1000 de Cincinnati a ser palco da celebração da meia centena.

  • Estoril Open 2008: Festa portuguesa

No meio de tanto título há um celebrado em solo português: a primeira presença de Roger Federer no Estoril Open não poderia ter corrido melhor, com o tenista suíço a caminhar para a vitória de forma irrepreensível. De lamentar, só que devido a uma lesão de Nikolay Davydenko a final não tenha sido concluída, com o helvético a ser consagrado campeão quando vencia por 7-6(5) e 1-2.

  • US Open 2008: Big Roger na Big Apple

Tal como em Londres, também em Nova Iorque conseguiu vencer por cinco vezes consecutivas — e também aqui a sexta ficou por um triz, com Juan Martin del Potro a levar a melhor na final de 2009.

À data, os títulos conquistados por Roger Federer em 2004, 2005, 2006, 2007 e 2008 continuam a ser os “únicos” no seu palmarés, pelo que aquele que em tempos foi um dos palcos onde mais sucesso teve é, agora, aquele onde não ganha há mais tempo (desde então perdeu as finais de 2009 e 2015).

  • Roland Garros 2009: Career Grand Slam

É um dos torneios com mais significado no currículo de Roger Federer. Até então com três finais consecutivas perdidas (sempre para Rafael Nadal), o suíço aproveitou o deslize do espanhol para Robin Soderling na quarta eliminatória para ir até ao fim e conquistar o título que lhe faltava, tornando-se no primeiro jogador desde Andre Agassi, 10 anos antes, a completar o Grand Slam de carreira.

https://www.youtube.com/watch?v=11QZxo3vJ94

  • Wimbledon 2009: Recordista de títulos em torneios do Grand Slam

Para uma ocasião histórica, um resultado… Histórico. Numa final de cortar a respiração, Roger Federer derrotou Andy Roddick por 5-7, 7-6(6), 7-6(5), 3-6 e 16-14 para regressar aos títulos no torneio de Wimbledon e ultrapassar Pete Sampras para se tornar no jogador masculino da história com mais títulos de singulares em torneios do Grand Slam no circuito masculino.

À data, o encontro entre Federer e Roddick tornou-se na final masculina de torneios do Grand Slam mais longa em termos de jogos jogados, com um total de 77 jogos.

  • ATP Finals 2011: Mais um recorde

De Houston (EUA) a Xangai (China) ou Londres, como Tennis Masters Cup ou ATP Finals. Num período de nove anos (2003-2011), Roger Federer venceu por seis vezes a competição que reúne os oito melhores jogadores num só local. A vitória de 2011 foi histórica porque lhe permitiu ultrapassar Ivan Lendl como o maior campeão da história do torneio.

  • Madrid 2012: A polémica terra azul também foi dele

A jogada do torneio de Madrid pode não ter sido a mais popular de sempre entre adeptos e jogadores — afinal, mais do que agradar à vista nas transmissões televisivas a terra batida azul deu que falar pela negativa –, mas deu ao torneio uma história para a vida e, no topo disso, dois históricos campeões. Na competição feminina foi Serena Williams quem venceu e na masculina o histórico título ficou a cargo de Roger Federer, que adicionou mais uma superfície à sua lista de vitórias.

https://www.youtube.com/watch?v=rFPkSoCyR74

  • Australian Open 2017: contra todas as expetativas

Depois de seis meses sem jogar e tantos anos a ser dado como acabado, Roger Federer — que estava fora do top 10 mundial — foi protagonista de um dos feitos mais impressionantes da história do desporto ao sagrar-se campeão do Australian Open. O percurso fez-se de vitórias impressionantes frente a Tomas Berdych, Kei Nishikori, Stan Wawrinka e, mais do que tudo, Rafael Nadal numa final que foi um verdadeiro hino ao ténis.

Ao vencer, o suíço não só chegou aos 18 títulos em torneios do Grand Slam como se tornou no primeiro jogador da história a conquistar pelo menos cinco títulos em três torneios do Grand Slam diferentes.

  • Wimbledon 2017: His Majesty the King

Se o Australian Open foi uma verdadeira surpresa, Wimbledon 2017 parecia escrito nas estrelas. Roger Federer não cedeu um único set rumo ao oitavo título no All England Club, um recorde absoluto no circuito masculino — batendo assim mais um recorde de Pete Sampras.

  • Australian Open 2018: Duas dezenas de Grand Slams

O Australian Open 2018 foi mais uma prova de longevidade dada por Roger Federer, cujo intervalo de tempo entre o primeiro e o último título em torneios do Grand Slam (quase 15 anos) significa um recorde absoluto no ténis masculino na Era Open.

E, claro, o tenista helvético tornou-se no primeiro jogador masculino da história a conquistar 20 títulos em torneios do Grand Slam.

  • Roterdão 2018: O regresso ao número 1

Mesmo com os títulos em Melbourne e Londres, Roger Federer falhou o assalto à liderança do ranking no final da temporada de 2017, pelo que teve de esperar mais alguns meses — e pedir um wild card à última hora — para regressar a um lugar que tão bem conhece. Aconteceu em Roterdão com uma vitória frente ao jogador da casa Robin Haase (a final foi ganha contra Grigor Dimitrov), e entretanto tornou-se no jogador mais velho da história a ser número um do mundo.

Duas menções que não têm direito a um lugar nesta lista

Os 100 títulos esta semana celebrados por Roger Federer dizem respeito às suas prestações em singulares no circuito ATP, o que significa que de fora ficam dois dos resultados que também têm uma enorme importância na sua carreira.

– Pequim 2008: ao lado do compatriota Stan Wawrinka, Roger Federer foi até ao fim na variante de pares para conquistar a medalha de ouro nos Jogos Olímpicos de Pequim. Entretanto, em 2012, ficou com a prata em Londres.

– Lille 2014: O Stade Pierre-Mauroy, em Lille, foi palco de um dos capítulos mais dourados da Taça Davis. Numa semana dramática, Roger Federer batalhou com uma lesão nas costas (que o afastou da decisão do ATP Finals, na semana anterior), para vencer o par ao lado de Stan Wawrinka e, já no domingo, derrotar Richard Gasquet para conquistar um dos poucos troféus que lhe faltavam.

Os 100 títulos de Roger Federer em números:

  • 30 cidades
  • 548 vitórias
  • 46.508 pontos ganhos (em 83.302)
  • 4.378 ases
  • 52.152 minutos em campo

Por categorias:

  • 20 Grand Slams
  • 6 ATP Finals
  • 27 Masters 1000
  • 22 ATP 500
  • 25 ATP 250
Total
0
Shares
Total
0
Share