Trata-se de uma perspetiva raramente demonstrada pelos jogadores. Novak Djokovic dá-nos uma chapada de transparência e honestidade acerca dos temas mais profundos – quiçá obscuros – do mundo do ténis. A oportunidade deu-se na conferência de imprensa que seguiu ao triunfo sobre Gael Monfils na madrugada passada.
O assunto surge na sequência de perguntas relativas às altas temperaturas sentidas durante o dia em Melbourne, às quais o sérvio se pronunciou demonstrando preocupação mas também compreensão para com o lado da organização. “É preciso criar um limite porque há um risco muito grande para a saúde. Mas também percebo que haja o fator dos bilhetes, em que se não jogares as pessoas ficam insatisfeitas. Tem que se ter em consideração diferentes ângulos antes de se tomar uma decisão destas”, referiu.
É precisamente este dilema que incomoda o campeoníssimo: de um lado a obrigatoriedade que leva os jogadores atuarem torneio após torneio independentemente das condições, e do outro as consequências futuras desses esforços extraordinários.
“És parte da indústria, porque o ténis tornou-se numa industria, tal como muitas outras modalidades a nível global. Agora é mais negócio que desporto. E enquanto alguém que jogou e joga esta modalidade exclusivamente por pura paixão, não gosto disto. Claro que somos compensados financeiramente, mas ao mesmo tempo o mais importante para nós é a nossa saúde e o que acontece após os 35/56 anos quando nos retirarmos”, começou por explicar.
“Existem muitos ex-jogadores que estão a ter muitas dificuldades, não conseguem fisicamente andar, correr, entre outras coisas. Penso que é um assunto muito complexo de abordar, tens de perceber aquilo pelo qual um jogador passa. Na perspetiva dos jogadores parece que estamos sempre numa espécie de pressa, obrigados as jogar os eventos mandatários e a defender os pontos necessários, no fim isto afeta tudo. Estás constantemente, semana após semana, a fazer parte desta dinâmica da nossa modalidade. E às vezes é simplesmente demasiado”, sublinhou.
De recordar que o ex-número um mundial discursou há poucos dias numa reunião de jogadores, na qual apelou à criação de um sindicato exclusivo a tenistas, independente e igualitário, com o intuito de se debater e agir perante tópicos fraturantes da modalidade. “Mas é a nossa escolha ao mesmo tempo, nós é que escolhemos se jogamos ou não. Por isso não quero soar mal agradecido, só acho que devem existir conversas racionais sobre estes assuntos”, concluiu.