Depois de todo o debate e polémica em torno da exclussão de russos e bielorrussos, o torneio de Wimbledon foi ganho por uma mulher nascida e criada na Rússia, país que representou até receber uma proposta muito apelativa do Cazaquistão: Elena Rybakina derrotou Ons Jabeur na final deste sábado e completou uma campanha de sonho no All England Club, o clube no qual não estaria autorizada a entrar se não tivesse adquirido a segunda nacionalidade em 2018.
Numa quinzena marcada pela decisão do torneio britânico (muito influenciada pelo governo), a número 23 mundial colocou a cereja no topo do bolo com uma reviravolta na final: 3-6, 6-2 e 6-2 foram os parciais da vitória.
Nascida em Moscovo, Elena Rybakina viveu durante 18 anos na Rússia. Os seus pais ainda vivem na Rússia. Mas em 2018, quando a federação de téis do seu país optou por dedicar o apoio que lhe era destinado a outros jogadores, tomou a decisão que muitos compatriotas tomaram nos anos anteriores: aceitou a proposta que lhe foi feita pelo Cazaquistão, país que lhe deu as condições de que precisava para perseguir o sonho de uma carreira profissional ao mais alto nível.
A decisão revelou-se muito acertada e e em 2020 disputou mais finais (cinco) do que qualquer jogadora no circuito feminino — quatro delas nos primeiros cinco torneios que disputou. Mas a pandemia de covid-19 trocou-lhe as voltas, fê-la regressar a Moscovo antes de recomeçar a treinar em Bratislava, na Eslováquia, e a forma não voltou a ser a mesma até 2021.
Nesse ano, já consagrada entre as melhores jogadoras do circuito, esteve perto de atingir a glória olímpica: em agosto de 2021, nos Jogos Olímpicos de Tóquio que foram adiados, derrotou Sam Stosur, Rebecca Peterson, Donna Vekic e Gargiñe Muguruza para chegar às meias-finais, onde foi travada em três sets pela futura campeã Belinda Bencic. No encontro de atribuição da medalha de bronze, nova derrota em três partidas, mas para Elina Svitolina, e o bronze a fugir-lhe entre os dedos.
Quase um ano depois, o momento de Elena Rybakina chegou. Talvez por não ter grandes expetativas (já de troféu nas mãos admitiu que não contava alcançar a segunda semana), a russa-tornada-cazaque arrasou Simona Halep nas meias-finais e este sábado, na final, superou uma entrada em falso que resultou numa primeira partida para esquecer.
Sem conseguir ser réplica na primeira partida, Rybakina reduziu os erros não forçados (cometeu 17 no primeiro set, mais do que os 16 entre o segundo e o terceiro set) e aproveitou a quebra de rendimento de Jabeur, que pareceu afetada pela facilidade com que ganhou vantagem na final, para iniciar a reviravolta mais importante da carreira. A tunisina, campeã em Berlim antes de chegar a Wimbledon e detentora de um estilo de jogo muito propício à superfície, era sem dúvida a favorita na relva do Centre Court, mas deixou-se levar pela tensão e falhou na tarefa de segurar o resultado, que teria feito dela a primeira mulher africana — e a primeira mulher árabe — a conquistar um torneio do Grand Slam.
Vitória para Elena Rybakina, vitória para o investimento do Cazaquistão. E o fim de uma dor de cabeça para Wimbledon, que tomou uma decisãos só equiparável à anunciada em 1948, quando proibiu a participação de tenistas alemães e japoneses após a II Guerra Mundial.