O fim de 2024 está aí à porta e o tempo já começa a ser de contas. Numa altura que nos fazem mergulhar nos vários rankings de final do ano em várias áreas da sociedade, porque não uma também relativa ao ténis? Vamos a uma viagem?
Foram 48 os eventos internacionais de uma época agora no fim. 48 provas espalhas por todo o país e com momentos marcantes para vários tenistas portugueses. Dos ITF aos Challengers, passando pelo regresso das competições WTA ao país uma década depois, muita recordação há a tirar da janela que agora se fecha.
Primeiro torneio, ainda em 2023, e primeira final lusa
Só mesmo no ténis, mas é mesmo verdade. A temporada abriu ainda em 2023 e na nave dos campos cobertos do Complexo de Ténis do Jamor para dois torneios Challenger, dois dos nove de 2024 na categoria – o que marcou um igualar do recorde absoluto no país numa só época.
O ano internacional teve logo um tenista português na final do torneio inaugural, nada mais nada menos do que o recordista nacional de títulos (10) e finais (23) no circuito Challenger. Gastão Elias disputou a melhor prova do ano logo no começo, ainda que tenha sido o polaco Maks Kasnikowski a sair vitorioso na primeira semana nos cobertos do Jamor.
Na segunda, o jovem talento suíço Leandro Riedi voltou a mostrar tudo o que é capaz e até negou a segunda final consecutiva a Elias ao bater o antigo 57.º ATP nas meias-finais.
No final do primeiro mês do ano decorreram duas competições nos campos cobertos do Complexo Desportivo do Monte Aventino, as primeiras de 2024 em solo nacional no circuito feminino. As duas provas coroaram estrelas emergentes no circuito WTA, duas tenistas que terminaram a temporada bem dentro das melhores.
Jessica Bouzas venceu a primeira semana (W75) e encerrou o ano no posto 55 da hierarquia feminina; na semana seguinte, a espanhola (que bateu Francisca Jorge na primeira ronda num evento e nas meias-finais da segunda prova) cedeu na final do W50 para uma das revelações do ano, a eslovaca Rebecca Sramkova, bem antes de Sramkova atingir o 43.º lugar do ranking no final de 2024.
A marcha triunfal e histórica de Jaime Faria pelo sul do país
A história de fevereiro e março é relativamente fácil de contar porque houve um denominador em comum a todos os torneios: Jaime Faria.
Antes disso, convém sublinhar o triunfo da antiga top 50 WTA (agora 93.ª) Anna Bondar no terceiro torneio no Monte Aventino, na reta final do mês, e do prodígio espanhol Martín Landaluce em Vila Real de Santo António ao amealhar o primeiro título (de muitos) da sua carreira profissional.
Quatro semanas, quatro torneios, quatro títulos. Jaime Faria arrasou no périplo algarvio e arrecadou Vila Real de Santo António, Faro, Quinta do Lago e Vale do Lobo de uma assentada para se tornar no primeiro português a conquistar quatro troféus pontuáveis consecutivamente. Faria somou 100 pontos e os 20 triunfos de empreitada só ficaram a seis do melhor registo nacional, logrado até por um dos seus treinadores, Rui Machado.
Parece que não, mas esta sequência ainda foi na presente temporada. Na altura até levantou o título mais importante (M25), vejam bem. Foi o início de tudo, mas já lá vamos.
Para terminar março, referir ainda que em Loulé Pedro Araújo (responsável pelo fim da senda de Faria ao bater o compatriota na primeira ronda) e Duarte Vale atingiram as meias-finais, numa prova ganha por Adria Soriano Barrera.
Abril dos torneios mil – e de história, novamente
Talvez o melhor mês do ano para ver ténis em Portugal. Ou pelo menos na zona de Lisboa.
Começamos pelo início, claro, mas também pelo mais importante. Não só do mês como do ano. A nona edição do Millennium Estoril Open consagrou o top 10 polaco Hubert Hurkacz, que celebrou no Clube de Ténis do Estoril o primeiro título de terra batida da carreira.
Mas não só, ou diríamos nós que o campeão conta pouco da história do torneio. O único torneio ATP português – em 2025 vai ser, excecionalmente, um dos mais fortes Challengers – não parou de impressionar pela narrativa. Jaime Faria furou a fase de qualificação em estreia no circuito principal, Henrique Rocha deu boa conta de si próprio contra a lenda Gael Monfils, Nuno Borges lançou-se nos quartos de final no maior torneio nacional pela primeira vez e foi travado num encontro polémico. Só que todo o palco foi ‘roubado’ por João Sousa.
O maior tenista português de todos os tempos (ex-28.º e vencedor de quatro títulos ATP em 12 finais) encerrou a gloriosa carreira no local onde foi mais feliz, quando levantou o troféu em 2018. O prodígio Arthur Fils foi o responsável pelo fim dentro do court, mas as memórias e o legado ficaram para a posteridade.
Na semana seguinte, Portugal voltou a receber o Grupo I da zona Europa/África da Billie Jean King Cup e a seleção feminina voltou a garantir o apuramento, numa prova que contou com estrelas de gabarito mundial como Jelena Ostapenko, Maria Sakkari, Caroline Wozniacki.
Outras das mais conceituadas a marcar presença foi Clara Tauson, que atingiu a final do Oeiras Ladies Open, o primeiro torneio sob a égide do WTA (ainda que uma prova 125 não seja do circuito maior) em Portugal desde o antigo Estoril Open de 2014. A dinamarquesa cedeu numa final épica face à neerlandesa Suzan Lamens (no final do ano celebrou ainda mais alto, num torneio 250), que triunfou por nove vezes em nove encontros na quinzena do Jamor, entre a seleção e o torneio individual.
Um dia antes da tremenda final individual houve história nacional na de pares. As irmãs Francisca Jorge e Matilde Jorge bateram Kristina Mladenovic (uma das melhores dos últimos anos na variante) e Harriet Dart perante um Court Central do Complexo de Ténis do Jamor repleto de público a testemunhar o primeiro título WTA do ténis português. Ambas atingiram os quartos de final no quadro de singulares, um marco para as duas vimaranenses.
Em simultâneo, Francisco Comesana ficou com o Oeiras Open 125, numa prova em que o argentino ficou a dois pontos de ser eliminado nas meias-finais contra Jaime Faria, que não conseguiu a final inaugural na categoria Challenger. Não por muito tempo.
Para encerrar o mês tenístico, a ação passou para o Clube Escola de Ténis de Oeiras. A nona edição do Oeiras CETO Open foi a mais relevante, a primeira como W100 (nível máximo no que aos ITF diz respeito), e viu a croata Jana Fett bater a húngara Panna Udvardy (orientada por Felipe Cunha e Silva). As irmãs Jorge voltaram a festejar.
Um mês depois, o Jamor recebeu outra prova de nomeada e Jaime Faria saiu então a sorrir. Não só garantiu a estreia em provas do Grand Slam como, sobretudo, somou o primeiro troféu Challenger da carreira após a desilusão no Oeiras Open 125. O lisboeta tornou-se no 12.º português a ganhar neste nível e no 16.º a entrar no top 200.
Sucesso em casa, com certeza
Para além de Faria, três portugueses estiveram em plano de destaque nos torneios nacionais de maio e junho. Na segunda semana da quinzena de Montemor-o-Novo, a número três lusa Angelina Voloshchuk só caiu nas meias-finais diante de Eudice Chong após lograr os maiores triunfos da curta carreira de 17 anos. Em Elvas, Duarte Vale só perdeu na final face ao mais cotado Antoine Escoffier, francês que na semana anterior também tinha levantado o troféu em Setúbal.
Em meados de junho, Francisca Jorge arrecadou o sexto e maior título do palmarés individual ao ganhar o ‘seu’ torneio de Guimarães (W75). Foi, igualmente, o segundo sucesso mais importante do ténis feminino português.
Seguimos com o mês de julho, período com cinco provas ITF no país entre homens e mulheres. E se os torneios femininos não correram bem às portuguesas (a checa Gabriela Knutson venceu em Corroios, a polaca Maja Chwalinska no Porto Open e a russa Anastasia Zakharova superou Mladenovic no W100, o segundo de três de 2024 em Portugal, da Figueira da Foz), as duas competições masculinas foram festejadas na língua de Camões.
Cinco anos depois, Frederico Silva regressou aos títulos ao vencer em Castelo Branco. Caído para o posto 628 – foi operado ao ombro esquerdo e só iniciou a temporada em março -, o tenista natural das Caldas da Rainha começou na cidade albicastrense uma notável recuperação que quase o levou novamente aos 300 melhores do mundo no final da época.
Na semana seguinte, o Porto Open dispôs de uma final 100% portuguesa entre João Domingues e Francisco Rocha. E se o mais velho dos irmãos Rocha disputou a primeira decisão individual da carreira, Domingues celebrou dois anos após a última alegria, em maio de 2022, na altura a nível Challenger.
Verão com regresso do circuito Challenger e Matilde Jorge a voar
Na dupla edição de Idanha-a-Nova, João Dinis Silva sacou o primeiro ponto ATP da carreira na primeira semana, Frederico Silva ficou pelo penúltimo dia na segunda, onde Tiago Pereira e Diogo Marques se sagraram campeões de pares. Só que o mês de agosto ficou marcado pelos dois torneios Challenger na cidade invicta, em clubes diferentes.
No Porto Open do Monte Aventino, Jaime Faria voltou às meias-finais de uma competição de nível 125 resistindo estoicamente a todas as debilidades físicas da semana, numa prova vencida pelo dinamarquês August Holmgren. Sensivelmente um mês depois (já terminou em setembro), na CT Porto Cup, um novo torneio no calendário luso jogado no histórico Clube de Ténis do Porto, os portugueses não foram muito longe e na decisão o búlgaro Adrian Andreev derrotou o espanhol Carlos Taberner.
Setembro foi recheado de provas ITF e com tremendo sucesso para Matilde Jorge em particular. A mais jovem das irmãs vimaranenses somou o primeiro título de singulares da carreira em Leiria e atingiu a segunda meia-final logo a seguir em Santarém (perdendo para a eventual campeã Stacey Fung).
A tenista de 20 anos não teve o mesmo registo nas Caldas da Rainha, a terceira e derradeira competição ITF W100 em Portugal, mas Francisca Jorge alcançou as meias-finais pela segunda vez na carreira na categoria e não andou longe da maior final do palmarés. Só pela frente teve uma das maiores prodígio do circuito feminino, a russa de 17 anos Alina Korneeva, que replicou o sucesso no Oeste no ano anterior (Figueira da Foz) e saiu de Portugal com a bagagem mais cheia.
O combinado do CIF (o mais antigo do país) foi o evento mais marcado pela chuva em toda a temporada. A super talentosa tenista de Andorra Victoria Jimenez Kasintseva segurou o ITF W75, o suíço Alexander Ritschard ficou com o antepenúltimo Challenger nacional de 2024 – Henrique Rocha chegou aos quartos de final, o que aconteceu pela primeira vez em provas da categoria em solo nacional.
Na semana seguinte, a cidade dos arcebispos recebeu pela sexta vez o Braga Open. O jovem dinamarquês Elmer Moller recebeu o primeiro troféu Challenger de braços abertos (numa competição quase toda jogada em recinto coberto devido ao mau tempo e com vários estrangeiros de renome) e na variante de pares Francisco Cabral triunfou pela segunda vez no torneio, neste caso na estreia absoluta ao lado do francês Theo Arribage.
O restante mês de outubro foi palco de vários torneios ITF. Na quinzena na Beloura houve frutos para as cores nacionais: Duarte Vale chegou às meias-finais na semana um, Frederico Silva e Pedro Araújo ficaram pela ronda anterior; Silva selou o segundo troféu do ano na prova seguinte, batendo na decisão o belga Gauthier Onclin, finalista igualmente sete dias antes contra Evgeny Karlovskiy. Nessa segunda metade da quinzena, Araújo atingiu as meias-finais (cedeu para o caldense), João Domingues, Vale e Francisco Rocha os quartos de final e o quadro de pares foi amealhado por Duarte Vale e Tiago Pereira – o oitavo sucesso do algarvio na variante num total de 11 finais (em singulares venceu os primeiros dois títulos, ambos em Monastir durante o verão), feitos que o levaram a ser o segundo melhor luso no ranking de pares a fechar o ano.
O circuito feminino internacional nas terras nacionais passou pelo algarve, sete meses depois do brilharete de Jaime Faria no Sul do país. Kristina Dmitruk sorriu na Quinta do Lago, salvando um match point nos quartos de final contra Matilde Jorge, que venceu em pares e atingiu mesmo a final em Faro na prova posterior. Foi a segunda final da número dois nacional, mas a campeã acabou por ser a ainda mais jovem Monika Stankiewicz, polaca de 17 primaveras, titular no circuito profissional pela primeira vez. Por fim, Leonie Kung arrasou para ficar com Loulé.
Reta final do ano entre o Sul e o Norte
Continuando no Sul, Vale do Lobo recebeu em meados de novembro duas provas ITF, as duas últimas do ano para os homens em Portugal. Duas provas de imenso sucesso para Frederico Silva e Pedro Araújo. O primeiro bateu o segundo na segunda final 100% nacional da temporada e Araújo ficou ainda com o vice-título de pares. Dias depois, Silva perdeu na final com Onclin e o lisboeta, que em 2024 levantou os primeiros títulos da carreira, em Monastir, cedeu nas meias-finais e conquistou o terceiro troféu internacional de pares do palmarés.
E se os torneios ITF masculinos terminaram no Sul, os femininos foram à Madeira e ao Norte, mais concretamente a Lousada. Dmitruk voltou a celebrar em Portugal, já a primeira competição em Lousada foi ganha pela belga Hanne Vandewinkel. Na segunda, Matilde Jorge ficou a um triunfo do segundo título do ano, mas foi a francesa Margaux Rouvroy, primeira cabeça de série, a festejar.
Terminamos a viagem que já vai bem longa na Maia, um dos palcos tradicionais de encerramento da temporada ATP pela sexta vez, semana também das últimas contas para o Major inicial da época seguinte e para Henrique Rocha a última chance de ingressar no Next Gen Finals de Jidá, evento anual com os oito melhores jogadores de sub 20. O portuense chegou aos quartos de final, mas só a invencibilidade daria bilhete para a Arábia Saudita.
Assim, a sétima edição do Maia Open não teve um campeão português como no ano anterior, no qual Nuno Borges cumpriu o sonho de menino de vencer em casa, mas em pares Francisco Cabral prevaleceu pela terceira vez, desta ao lado de Arribage como em Braga semanas antes. Na prova individual, Damir Dzumhur garantiu o apuramento direto para o Australian Open e somou o sexto título do ano no ATP Challenger Tour, segundo melhor feito da história da categoria numa só temporada.
Encerramos assim esta retrospetiva pelos caminhos de Portugal, de lés a lés. Um ano em cheio, repleto de histórias e muitas de sucesso para os tenistas portugueses nas quase meia centena de torneios internacionais da época que findou.
Mas já sabem, quando uma janela se fecha, uma porta se abre e se 2024 está prestes a desvanecer, 2025, mesmo ao virar da esquina, está com vontade de florir com promessa de muito mais viagens lado a lado.