João Cunha e Silva e os torneios internacionais em Portugal: “São um enorme trampolim para que mais jogadores possam aparecer”

PORTO – Foi entre duas sessões de treino e de livro na mão que João Cunha e Silva se sentou à conversa com o RAQUETC. Em pleno Clube de Ténis do Porto, onde esta semana se joga a 18.ª edição do Porto Open, o ex-número 1 nacional, agora treinador, falou da sua academia, do momento que o ténis português atravessa e, claro, da eliminatória da Taça Davis que aí vem.

O CETO – Clube Escola de Ténis de Oeiras e a Cunha e Silva Tennis Academy viveram recentemente momentos importantes, com a inauguração de campos de padel e de ténis numa superfície nova para o clube, a de piso rápido (estes últimos situados no Polo de Santo Amaro, junto à marginal que liga Lisboa a Cascais).

Concluídas as obras, o treinador e Diretor Geral da Cunha e Silva Tennis Academy está “novamente focado a 100% no trabalho dentro do campo” que é feito com vários jogadores. Entre eles, Felipe Cunha e Silva, Marco Wright, Cláudia Cianci e Sara Lança.

Desde cedo responsável pela formação e desenvolvimento de várias das grandes figuras do ténis nacional, João Cunha e Silva considera “louvável” o esforço que a Federação Portuguesa de Ténis está a fazer, em parceria com alguns clubes e entidades, para organizar mais provas internacionais. “É um enorme trampolim para que mais jogadores possam aparecer e o nível médio se fortaleça.”

Com o ténis masculino a atingir um patamar que tem visto cada vez mais jogadores celebrarem conquistas ao nível internacional, o ténis feminino precisa, diz, “de uma contínua aposta na sua formação.”

“Penso que não há muita volta a dar [em relação ao número inferior de jogadoras em relação a jogadores]: culturalmente, será difícil termos o mesmo número de mulheres que homens a jogar, porque a cultura no mundo ocidental faz com que a quantidade de mulheres e raparigas mais novas envolvidas no desporto e nomeadamente no de alta competição, apesar de ter aumentado nos últimos anos, seja sempre menor”, comenta Cunha e Silva.

“Lembro-me de a dada altura a Diretora Técnica da Federação Francesa de Ténis ter dito que eles investiam tanto em termos financeiros no ténis masculino como no feminino, e apesar de muito bons resultados, porque a França como todos sabemos é uma enorme potência em todos os níveis e ambos os circuitos, não eram comparados àqueles que eram conseguidos no circuito masculino.” A razão? A cultura do mundo ocidental, uma vez mais.

“É uma questão cultural, e por isso nunca vamos conseguir fazer frente à mentalidade dos países de leste, como a Rússia, a Bielorrússia, a Ucrânia, etc. As As próprias famílias olham para as jogadoras de uma maneira que os países ocidentais apenas conseguem olhar para os rapazes. Elas vêem nas raparigas um estilo de vida para as famílias, mesmo que isso implique enormes sacrifícios para as raparigas.”

Traduzido por milhares, milhões de pessoas, “este aspeto faz toda a diferença.” Também o ténis argentino é dado como exemplo por João Cunha e Silva. Ao RAQUETC, o técnico fala da sua admiração pela cultura argentina, “um país com uma situação geográfica muito difícil em relação ao resto do mundo e que se bate sempre com dificuldades económicas grandes e que tem sempre uma escola de ténis e uma mentalidade fantásticas”.

Isto porque também a argentina, que é considerada uma grande potência do ténis e conta, ao longo dos anos, com várias figuras reconhecidas a nível mundial, verifica uma grande diferença entre os resultados obtidos no circuito masculino e o feminino.

Da América do Sul, e sempre atentos ao relógio porque minutos depois era hora de João Cunha e Silva voltar ao campo para mais uma sessão de treino, regressamos “ao nosso Portugal”.

Diz o treinador que “aqui e ali temos tido resultados muito, muito bons. Temos a Michelle Larcher de Brito, que tem conseguido resultados extraordinários, se calhar um pouco aquém das expetativas criadas por ela e por pessoas do ténis, mas que não deixam de ser absolutamente incríveis, a Maria João Koehler, com tudo aquilo que fez numa altura em que havia muitas dificuldades para ela poder ter sucesso no mundo do ténis, a Neuza Silva, a Frederica Piedade, a Ana Catarina Nogueira… É verdade que são menos diferentes, mas como digo há menos tradição, menos cultura e principalmente menos jogadoras a jogar.”

O trabalho, esse, diz estar a ser “bem feito”, e insiste que “a formação precisa de continuar a ser bem trabalhada. E é óbvio que se tivermos milhares de raparigas a trabalhar na base da pirâmide, a probabilidade de existirem mais resultados é maior do que se tivermos centenas ou apenas dezenas.”

O relógio aproximava-se das 17h, hora do treino da tarde, mas Cunha e Silva continuou com a mesma disponibilidade que todos com que ele já se cruzaram conhecem e aproveitámos para mais uma pergunta, esta, claro, sobre a Taça Davis. E começámos pelo óbvio: acredita? “Altamente ambicioso”, João Cunha e Silva continua a ser o jogador português com mais vitórias (37) e mais eliminatórias (30) disputadas com a camisola lusa e não esconde que sim. “Claro que sim.

Diz que “muitas das nossas aspirações passam pelo João Sousa, que tem sido um jogador a todos os títulos admirável” e ainda que “ajudaria imenso a nossa seleção ter um ou dois especialistas de pares, porque isso ia retirar um grande peso e cansaço ao João Sousa e ao Gastão Elias, que muitas vezes ombreia com ele nessa situação”, enquanto relembra “o peso extra, muito, muito grande, que fiz muitas vezes com o Nuno Marques” e a grande diferença que foi passar, mais tarde, a contar com a ajuda de Emanuel Couto e Bernardo Mota,

Tik tak, tik tak. O tempo não pára, o trabalho também não. João Cunha e Silva tinha um treino para dar e nós vários textos para terminar. Assim terminou a conversa. A raquete saiu do saco, as bolas a ela se seguiriam. Para mais tarde, certamente, a retoma do livro. Um hábito já seguido pelo filho, Felipe.

Total
0
Shares
Total
0
Share