Se fossem publicadas obras sobre todas as campanhas em torneios do Grand Slam, a de Rafael Nadal em Roland Garros seria uma epopeia: aos 31 anos, o tenista espanhol derrotou Stan Wawrinka na sua 10.ª final em Paris para conquistar pela 10.ª vez na carreira o segundo Major do calendário, fazendo história como nunca ninguém fez em Paris.
A terra batida de Roland Garros é a casa de Rafael Nadal. Foi lá que deslizou pela primeira vez para os holofotes da modalidade, foi lá que começou a deslizar para os holofotes do mundo do desporto e é lá que, tantos anos depois, continua a deslizar para celebrar como muito poucos. A vitória deste domingo, conseguida com os parciais de 6-2, 6-3 e 6-1 frente a um dos jogadores mais perigosos do circuito vem comprová-lo mais uma vez.
Mais confortável do que ninguém em Roland Garros, foi por isso sem surpresa que se viu Nadal entrar melhor na final — a 10.ª que disputou nas últimas 12.ª edições. Mesmo se do outro lado da rede estava Stan Wawrinka, até então com um registo impecável em finais nos 4 maiores torneios do mundo (ganhou as 3 primeiras que disputou).
E se o primeiro break point do encontro até foi conquistado pelo jogador helvético, foi o maiorquino quem conseguiu a primeira quebra, que lhe permitiu iniciar uma série de quatro jogos consecutivos rumo à vitória no primeiro set.
Com os números do seu lado (as estatísticas dizem que só por uma vez perdeu uma final do Grand Slam depois de conquistar a primeira partida, tendo ganho as outras 11 decisões que iniciou nessa condição), Nadal abriu o Ato II — e falamos em atos porque entre as várias caras (muito) conhecidas nas bancadas do court Philippe Chatrier estava Nicole Kidman — com a confiança no máximo.
E não demorou a que a confiança redobrada se traduzisse num break para dar início à segunda partida: claramente mais “em jogo” do que o adversário, Nadal disparou winners em todas as direções e de todas as zonas do campo para controlar também o segundo set, dando cada vez mais indícios de que se trataria de um novo triunfo em parciais diretos.
A espaços à procura de oportunidades mas sem hipóteses de reagir tal foi o domínio de Nadal, Stan Wawrinka tornou-se praticamente num mero espetador em court e, ao 1.º match point, chegou o momento mais aguardado e imaginado dos últimos 15 dias: o ajoelhar de Rafael Nadal numa terra batida que tanto lhe deu e à qual tantas emoções dá, perante um court Philippe Chatrier de pé para aplaudir um feito tão poucas vezes visto no desporto. A chegada à glória pela 10.ª vez num dos torneios mais prestigiados e importantes do planeta.
Segunda-feira, Rafael Nadal estará de volta ao número 2 do ranking ATP, mas este domingo, em Paris e na terra, é o número 1. Depois de “Lá Décima” em Monte Carlo e “Lá Décima” em Barcelona, chegou a hora de “Lá Décima” em Roland Garros.
UMA CAMINHADA PERFEITA
O opus magnum de Rafael Nadal começou a ser construído com muita precaução desde cedo e resultou num dos mais belos (e intimidantes) registos de que há memória em torneios do Grand Slam: até à final cedeu apenas 29 jogos, derrotando cinco adversários sempre em parciais diretos — Pablo Carreño-Busta foi a exceção, porque desistiu devido a lesão quando já perdia por 6-2 e 2-0.
Primeiro Benoit Paire (6-1, 6-4 e 6-1), depois Robin Haase (6-1, 6-4 e 6-3), Nikolaz Basilashvili (6-0, 6-1 e 6-0) e Roberto Bautista Agut (6-1, 6-2 e 6-2), até à desistência de Carreño-Busta, a que se seguiu o triunfo por 6-3, 6-4 e 6-0 nas meias-finais, frente a Dominic Thiem, e, por fim, na final, sobre Stan Wawrinka.
Histórias de amor como a de Nadal com o pó de tijolo existem poucas, e são os números que o dizem: a “Décima” em Roland Garros traduz-se no 53.º troféu do maiorquino na superfície, mais do que qualquer outro jogador algum vez conseguiu. Já em termos de carreira, passam a ser 73 os troféus erguidos (ou mordidos) por Rafael Nadal.
Esta epopeia já ninguém lhe tira, mas ficará Rafael Nadal por aqui? Para já, uma coisa é certa: o Rei da Terra Batida é, a partir deste domingo, ainda mais rei.